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Mostra SP | Crítica: Um Noir nos Balcãs

Para os aficionados em cinema sueco, será exibido na Mostra SP, Um Noir nos Balcãs de Drazen Kuljanin, uma obra que atira para todos os lados, sem receio de cair em exageros. E cai, como cai! Se resolverem pesquisar a filmografia do autor nascido na Bósnia, verão que o filme é apenas seu segundo longa metragem na carreira na posição de diretor. Curioso que isso deixa transparecer mesmo.

Existe um estereótipo que diz de cineastas que acabaram de sair da faculdade de cinema, que costumam querer mostrar todo o arsenal de conhecimento e referências que possuem tudo na mesma leva. Claro que necessariamente isso não significa algo ruim, pois alguns diretores mostraram seus melhores trabalhos quando mais jovens, como Tim Burton e Darren Aronofsky, só para citar exemplos mais populares entre cinéfilos. Mesmo assim, esta ansiedade de mostrar trabalho, por vezes, gera um resultado atabalhoado, apressado, ou excessivamente desarranjado. Que é o caso de Um Noir nos Balcãs.

O longa de Kuljanin conta a história do casal Nina e Oskar que perderam a filha durante uma viagem a Montenegro já fazem cinco anos. Enquanto Oskar aparenta ter superado a perda, e anseia seguir em frente, Nina continua obcecada em encontrar a menina viva e se vingar dos responsáveis. Quando Nikola, o detetive que nunca desistiu do caso, encontra novas informações, Nina irá fazer de tudo para chegar ao fim disso.

Interessante que a obra de Drazen Kuljanin começa muito bem. Certamente, as melhores falas do filme se encontram na apresentação da trama, logo na primeira cena onde vemos Nina, papel de Disa Ostrand, comprando drogas. Mesmo em uma cena expositiva bem no começo, é de grande impacto quando Nina explica ao cara que lhe arranja as drogas, qual é o nível de dor que uma mãe ou um pai sentem ao perder sua criança.

Mas após essa introdução, ficará fácil perceber a ideia de Kuljanin. Um Noir nos Balcãs é, de alma, mais estilo que conteúdo. Os aspectos técnicos como fotografia, luz e montagem deixam isso muito claro. Mesmo a câmera, quase sempre na mão e nunca no tripé, faz movimentos pouco ortodoxos, como tombar a câmera para os lados simulando uma árvore caindo.

Óbvio, que nessa liberdade de que tudo é permitido, o cineasta também consegue criar belas composições, uma riqueza para os olhos, além de haver alguns poucos aspectos do cinema noir. Mas estranhamente, isso raramente harmoniza ou faz o contrário, exaltar contrastes interessantes dentro do enredo. Um bom exemplo deste amontoado de elementos se encontra na cena onde o casal está em um bar karaokê escuro, mas levemente azulado, com abajures e lâmpadas de todas as cores possíveis, enquanto Oskar canta em um mini-palco com um microfone coberto de luzes, que lembram pisca-piscas.

Já a montagem, usa de alguns truques. Temos clarões, divisão na tela com personagens que se encontram no mesmo ambiente, mas a que mais se repete são os muitos comerciais de tv de diferentes marcas de cigarro. Todos estes bem antigos, tipo preto e branco.

Existe uma intenção claríssima nesta escolha de editar comerciais de tv de cigarros dentro da obra. Estes, todos americanos, mostram o prazer e a alegria de fumar do americano na era do American Way of Life, no traduzido Jeito Americano de Vida. Que serve como um belo contraste aos fumantes do tipo chaminé em Um Noir nos Balcãs que acendem cigarros compulsivamente, principalmente Nina e o detetive Nikola. Esse artifício instiga a curiosidade do espectador, sem dúvida, mas ao mesmo tempo começa a caducar o tratamento da narrativa, devido a sua repetição exaustiva. Faltou a Kuljanin, o que sobrou a Mike Mills em Toda Forma de Amor, no quesito montagem, claro.

No meio de tantos truques e elementos, Um Noir nos Balcãs é em sua gênese um filme de vingança com uma mãe em estágio de luto contínuo, e pior, autodestrutivo. Nenhum dos personagens no filme exibido na Mostra SP consegue exprimir qualquer traço de redenção. Estão destinados a ficaram dançando indefinidamente no chiaroscuro, belas canções que parecem felizes, mas na verdade são tristes. Como disse Nina, certas coisas não é possível nem dar um nome, pois são impossíveis de se compreender. Mais um sintoma no cinema do mal-estar europeu.

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