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Crítica | Minha Vida em Marte

Apesar do título longo, Os Homens São de Marte… E É pra Lá que Eu Vou marcou um sucesso para Mônica Martelli, tanto nos palcos quanto nas telonas, por sua abordagem franca e cheia de humor do universo de uma mulher em busca de um parceiro. Já Minha Vida em Marte, que seria um ótimo título para uma biografia do músico David Bowie, é uma sequência para o filme de 2014 e também se baseia em uma peça de Martelli, tentando repetir a mesma fórmula de sucesso para retratar outra fase da vida de sua protagonista.

Ao final do longa anterior, Fernanda (Mônica Martelli) parecia ter encontrado o parceiro para a vida toda em Tom (Marcos Palmeira). O enredo de Minha Vida em Marte tem seu início anos depois, com os dois casados e já dividindo seu espaço com uma filha pequena – e com uma química já não tão forte. A princípio, a trama foca nos descontentamentos de Fernanda com seu casamento, porém sem motivos muito específicos: primeiro, perde a vontade de transar com Tom, e depois, quando passa a recuperar sua libido, é o marido quem não tem a mesma disposição.

Tudo desanda até que Fernanda e Tom eventualmente se separam, seguindo seus rumos na vida. Aqui, a história que poderia tão bem ter ido mais a fundo na realidade de um casamento, volta a seguir a mesma linha da anterior, porém com um detalhe: a protagonista agora tem 45 anos e, com o sentimento de que falhou em sua missão mais importante, deve se acostumar à ideia de se sentir atraente de novo e, quem sabe, conquistar um novo homem. Nisso ela tem a companhia do fiel amigo Aníbal (Paulo Gustavo), que aqui tem maior destaque e grande parte do tempo em tela.

São admiráveis as intenções de retratar o cotidiano de uma mulher solteira na meia-idade com irreverência, mas há uma série de problemas que entram no caminho de uma realização melhor para essa proposta. O primeiro deles é a falta de uma estrutura consistente, algo que se reflete na falta de um foco temático específico. O roteiro escrito a ene mãos, incluindo as de Gustavo e da diretora Susana Garcia, não equilibra o tempo dedicado a cada uma das etapas que compõe a transformação da vida de Fernanda, ou melhor, falha em conectá-las com naturalidade. O cotidiano de casada deixa de existir em tela rapidamente e há pouco peso dramático na separação.

A falta de uma estrutura torna-se ainda mais evidente quando o longa passa a focar nos encontros e passeios de Fernanda e Aníbal, quase sem nenhum intervalo entre eles. São praticamente esquetes em que Martelli e Gustavo falam ou sobre homens, ou sobre a aparência física da protagonista, ou sobre os dois, tudo enquanto consomem do bom e do melhor. O trecho gravado em Nova York, por exemplo, mais parece um programa especial de viagens do canal GNT do que uma narrativa cinematográfica, apoiando-se nas capacidades de improviso de seu elenco. Por mais que algumas ocasiões sejam bastante agradáveis – os filmes The Trip mostram que é possível fazer bom cinema nesse modelo -, especialmente pelo timing de Gustavo, a falta de respiro entre esses momentos os torna maçantes.

Além disso, Minha Vida em Marte é problemático em camadas mais profundas. O que deveria ser uma carta de amor à amizade de seus protagonistas, algo que apenas fica mais destacado rumo ao final, acaba exaltando mais o materialismo e a adequação a valores do que qualquer outra coisa. É compreensível, por um lado, que Fernanda tente suprir seu vazio consumindo coisas caras e procurando homens, mas por outro lado é decepcionante que o longa não trabalhe a busca por amor próprio da protagonista ou sua amizade com Aníbal com o mesmo interesse que tem em bens e homens. Estilo de vida é um tema justificado e que pode render boas experiências, afinal Sex and The City é um sucesso, mas não é algo que se limita apenas a esses aspectos.

No fim, Minha Vida em Marte cai no mesmo grupo de filmes que o recente O Homem Perfeito, com uma execução técnica correta e um elenco sólido, mas ainda muito acomodado em seu retrato de uma mulher em seus quarenta e tantos anos. Tanto aqui quanto ali, tenta se passar uma ideia de que as protagonistas, ambas mulheres autônomas, estão sendo celebradas por si só, portanto é decepcionante que os dois longas tenham homens ou dinheiro como objetivos primários. Assim, mesmo que Minha Vida em Marte seja um tempo mais agradável de se passar nos cinemas, com os carismas de Mônica Martelli e Paulo Gustavo, a sensação é a de que a conquista de sua protagonista e o valor da amizade foram reflexões tardias e não foco dos esforços da obra.

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