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Crítica | Histórias Assustadoras Para Contar no Escuro

Apesar de ter dirigido apenas três longas, dos quais um praticamente se perdeu no tempo – Future Murder -, André Øvredal é um nome promissor do cinema de gênero recente, tendo demonstrado ao longo de seus dois últimos projetos uma capacidade invejável de adaptação a diferentes premissas e formatos. Enquanto em O Caçador de Troll ele experimentou uma comédia aventuresca com, ora, trolls dentro da linguagem limitada do found-footage e ainda assim encontrou espaço para exibir truques próprios, Øvredal fez no seguinte A Autópsia um terror de confinamento dos mais elegantes, que apesar de tropeços trouxe luz à habilidade que o diretor possui em trabalhar com a sugestão.

Agora acolhido por Guillermo Del Toro, o cineasta norueguês assume o comando de outro projeto diferenciado, Histórias Assustadoras Para Contar no Escuro. Flertando com a antologia de terror, o longa roteirizado por Dan e Kevin Hageman – com um dedo do próprio Del Toro – traz uma única trama que, a partir da presença de um livro de contos amaldiçoado, praticamente se segmenta em pequenas pílulas variadas, cada uma com uma nova ameaça monstruosa que surge conforme um novo conto se escreve nas páginas. É o que descobrem um grupo de jovens em pleno Halloween, liderados por Stella (Zoe Margaret Colletti), no ano de 1968.

Cada conto tem como alvo uma das personagens, e assim o longa assume uma dinâmica similar, por exemplo, àquela vista na franquia Premonição – apenas que aqui os protagonistas estão plenamente conscientes das maquinações sobrenaturais. Se o projeto deixa a desejar no desenvolvimento de personagens e arcos, embora sejam ambas presentes de certa forma, a progressão dos perigos é o que dá liga entre filme e – ao menos este – espectador. Embora o jovem elenco, com exceção do inexpressivo Michael Garza, imbua os momentos expositivos com algum carisma, é a dinâmica antológica que torna o longa espirituoso.

Diga-se de passagem, Histórias Assustadoras Para Contar no Escuro não é exatamente tão assustador quanto seu título promete, mas isto acaba por não ser um pormenor. Mirando com franqueza em um público mais jovem e aventureiro, Øvredal mantém suas tradições e privilegia a criatividade sobre o assalto visceral, a elegância na execução sobre o abuso de recursos como sons altos e ameaças atiradas no espectador. Adotando a estrutura que gradualmente se renova a partir da influência do livro, o cineasta se permite criar uma variedade de setpieces que diferem em forma e conceito, crescendo de forma substancial no último ato.

Duas sequências, em especial, merecem menções: a tentativa de fuga em um hospital tingido de luzes vermelhas, que cria uma desorientação labiríntica quase que exclusivamente através de panorâmicas e cresce em ansiedade no som diegético repetitivo que se mistura à boa trilha de Marco Beltrami e Anna Drubich, e a final, que apresenta duas linhas temporais que interagem em paralelo uma com a outra, o ápice da montagem de Patrick Larsgaard. As criaturas, por sua vez, também são chamativas, principalmente a última que surge, que, construída numa mescla impressionante de CGI e maquiagem prática, é capaz de desvincular os membros de seu corpo e transpassar obstáculos físicos.

Sob a condução confiante de Øvredal, o longa decola nestes picos de criatividade. Contudo, não deixa de existir a sensação de que Histórias Assustadoras poderia realmente encontrar o ápice de sua proposta como seriado de TV. Se as ameaças impressionam em um nível estético, falta a elas desenvolvimento, o que de um ponto de vista de roteiro as torna esquecíveis, dependendo da subjetividade de cada espectador. Desenvolvimento, no caso, não sendo sinônimo de exposição, explicação, mas espaço para crescer em seus mistérios, cultivando um incômodo mais duradouro e aprofundando o vínculo entre monstro e vítima – ou, talvez, esteja pensando demais em IT – A Coisa.

O aspecto fabulesco, característica dos projetos conduzidos ou apoiados por Del Toro, ainda não ganha construção sólida aqui. Repetir o velho truque dos voice-overs de abertura e conclusão que ecoam entre si, atestando um pretenso significado transformador à fantasia que ocorre ao longo do filme, acaba por não ser o bastante quando o drama de sua principal protagonista – e da antagonista que escreve o livro do além – fica subdesenvolvido. A partida da mãe e o relacionamento distante com o pai são mais adereços de roteiro do que temas propriamente interessantes aos roteiristas, que ao menos entregam um esboço de mensagem não tão óbvio com sua conclusão.

Caso colocado lado a lado com A Autópsia, Histórias Assustadoras Para Contar no Escuro é digno de um empate na filmografia de Øvredal. Onde o primeiro acertava, nos diálogos e na sugestão, este perde o ponto, e onde o primeiro tornava-se frouxo, no terror direto e fantasioso, este aqui se amarra bem. O resultado não compromete o status promissor de seu realizador, enquanto também não se compromete com grandes riscos dentro de sua proposta. Com estreia inoportuna dois meses antes do Halloween, o filme fica como uma produção competente e mais modesta que satisfazer jovens à procura de diversão de baixo impacto, com pinceladas pontuais de criatividade desatada.

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