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Dancing Queen | Crítica - 1ª Temporada

A rainha está de volta! Chega na Netflix, a nova série documental Dancing Queen, estrelando Alyssa Edwards, a artista drag que alcançou as estrelas na quinta temporada de RuPaul’s Drag Race, popular reality show que visa encontrar a próxima drag superestrela da América. E, mesmo não sendo a vencedora ao final da temporada, Alyssa fez seu nome, ganhou fãs e se tornou uma superestrela e referência para tantas pessoas mundo afora.

Alyssa Edwards, nascido Justin Dwayne Lee Johnson é muito mais que uma drag queen projetada para o palco. Sim, tanto o homem quanto seu alter ego travestido são capazes de dançar, elaborar belas coreografias, além de mostrar poderes de liderança e gestão de pessoas, pois Justin Johnson é um empresário de muito sucesso.

Residente da cidade de Mesquite, no republicano e conservador estado do Texas, Justin Johnson é dono de uma multipremiada companhia de dança chamada Beyond Belief Dance Company, no traduzido Companhia de Dança Além da Crença. Curiosa é a escolha de um nome assim, de leve conotação religiosa. Pois é exatamente isto que no seu íntimo o dançarino mostra: uma pessoa de muita fé e graça.

Percebe-se isso logo no primeiro episódio, onde Justin, homem gay, revela-se uma pessoa temente a Deus, que é agradecido e disciplinado sob os princípios da palavra sagrada. No mesmo episódio, em um gesto bonito, Justin Johnson aceita o pedido de dois amigos para ministrar a cerimônia religiosa de seu casamento, mas toda produzida como Alyssa Edwards, com uma Bíblia Sagrada de capa branca, repleta de cristais. Em momentos como este, é recompensador ver pessoas abrindo espaço em suas mentes, e buscando compreender o que não é similar a si mesmo e, perceber quê existem menos diferenças do que se pode imaginar.

A vencedora do Miss Gay America 2010, não reduz sua influência e relevância apenas no cenário drag do país. Não, pois certamente o trabalho de Justin Johnson como dono da Beyond Belief é onde percebe-se o valor de seu trabalho, que é capaz de quebrar barreiras de preconceito, em um lugar dentro da chamada América profunda, algo como Mesquite, cidade pequena do Texas.

Um contexto cultural atual: como um dos estados de visão política mais republicana nos Estados Unidos, ou seja, na maioria conservadores cristãos, o estado do Texas apresenta um dos cenários mais contrastantes e interessantes, por exemplo, a capital do estado, Austin. É na grande cidade um dos maiores e renomados festivais do mundo, o South by Southwest, que agrega cinema, mídia interativa, música além de conferências empresariais. Este festival é visto como um marco da modernidade progressista e tecnológica, principalmente entre jovens do mundo todo.

Em Austin, Terrence Malick gravou o modorrento De Canção em Canção, onde também foi produzido boa parte do divertido filme Garota Fantástica, dirigido por Drew Barrymore, que conta a história de uma garota que aspira sair de uma cidade pequena no Texas, e brilhar na cidade grande, assim como Justin Johnson.

São nas origens da história do dançarino, onde se encontram os momentos mais emocionantes do filme. Seja em partes onde vemos Justin Johnson revisitar sua humilde casa de infância, onde cresceu ao lado de três irmãs e um irmão, em um lar despedaçado pelo divórcio dos pais, gravidez na adolescência, além dos problemas alcoólicos e vício em heroína de duas irmãs, ou quando se encontra com uma de suas irmãs que havia brigado, e não falava há anos. Nestas situações é onde fica mais palpável e fácil estabelecer uma ligação com o astro da série. É pela empatia que percebemos as dores que Justin Johnson sentiu, que não é diferente do sofrimento que tantos passam em suas vidas, mesmo agora na América, que vive uma crise dos opioides, que devasta e fez a overdose se tornar a principal causa de morte entre jovens no país.

Mas drag é sinônimo de alegria, certo? Então, é muita alegria e glamour que Justin Johnson vai passar ao espectador, como ele próprio, mas especialmente como a belíssima Alyssa Edwards. Divertidos são os momentos que é estabelecido um diálogo entre o homem e a personagem drag, que costuma questionar e brincar com algumas situações vividas pelo dançarino no dia a dia. A versão produzida Alyssa Edwards diz que ela é como Batman, enquanto Justin é como o empresário Bruce Wayne, e que se Batman tem a capa, Alyssa tem a peruca.

Ainda assim, a rainha drag tem que dividir boa parte da cota de humor em Dancing Queen da Netflix com outras mulheres: as mães das crianças, na maioria garotas, dançarinas de sua companhia de dança. Alyssa Edwards diz que existem apenas três coisas certas na vida que são a morte, pagar impostos e mães malucas. De fato, algumas destas mães na série, são tão, quando não mais competitivas que suas talentosas filhas. Obstinadas, cuidadoras, protetoras, mas que vivem dando chiliques, ainda mais quando vêem suas filhas serem preteridas, chegando a ataques de raiva, e óbvio, de tanto drama, vivem chorando, mais que suas crias, por bons motivos mas também por seus exageros.

E, se existe uma boa razão para assistir Dancing Queen, está claro já no título: dança, muita dança. Tocante testemunhar a dedicação, trabalho e disciplina de alguns destes jovens, e evidente, seus talentos. Alguns dos alunos se destacam mais que outros, seja pelas habilidades no palco, ou simplesmente pelo carisma ou personalidade marcante, como por exemplo, Willow, Riley e Gabe em todas as apresentações durante toda a temporada, ou Kiana, uma moça perseverante que sempre busca melhorar a cada performance.

É neste caldeirão de emoções que Dancing Queen, produção original da Netflix tenta fisgar o espectador. Deixando uma marca que, talvez, muitos percebam. A de que o diferente, o alternativo sempre vai de encontro ao tradicional, e vice-versa, pois ambos os lados surgem do mesmo núcleo emocional, e quando racionalizamos e moldamos nossa personalidade e maneira de ver o mundo, toda nossa bagagem vêm junto, nas partes boas, mas também ruins. Justin Jonhson e Alyssa Edwards querem provar que somos diferentes, mas somos iguais.

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