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Marianne | Crítica - 1ª Temporada

Seja com séries brasileiras, americanas, indianas… Não importa. O gênero de terror sempre consegue atrair a atenção de um público considerável, e a mais nova produção francesa da Netflix, Marianne, tem apelo de sobra para manter os espectadores entretidos com esta primeira temporada. 

A série acompanha a jovem escritora de sucesso, Emma (Victoire Du Bois), cujos livros de terror possuem uma enorme base de fãs aficionados pelos embates entre a heroína Lizzie Clarke e a bruxa Marianne. Mas depois que a escritora decide encerrar sua saga literária (com um final aberto, ainda por cima), elementos do seu passado retornam para atormentá-la, e dão a entender que talvez as criações assombrosas de Emma podem estar afetando o mundo real. O primeiro episódio não demora para entregar os choques visuais e sustos que o público espera de suas produções assustadoras, e estabelece as dinâmicas e riscos desta trama sem muitos rodeios. 

É comum vermos séries de terror que abordem espíritos, demônios e afins, explorando o sobrenatural com certa liberdade para criar situações de tensão e imagens impactantes como bem entenderem. Ao lidar com “bruxaria”, no entanto, uma história geralmente acaba encontrando-se diante do que poderia se chamar de antinatural, ou seja, elementos que fogem à convenção e os típicos tabus sociais. Bruxas, em sua época de maior fama, às vezes, podiam não ser nada além disso: mulheres que fugiam da condição esperada pela sociedade.

 Sendo assim, é interessante notar como as “assombrações” de uma história de bruxa como esta, acabam demonstrando um esforço extra em favor do desconcerto chocante. Fantasmas andando sorrateiramente pelo canto da tela podem ser desconfortáveis, mas me sinto ainda mais desconfortável ao ver uma personagem dando uma cuspida certeira no olho de um pássaro morto. É um meio eficiente de inquietar o espectador sem os típicos sustos, e a maneira como esta consistência temática pode ser percebida na composição de diversas imagens aterrorizantes que permeiam a série, com certeza é um de seus maiores méritos. 

Também chega a ser revigorante poder acompanhar uma produção de terror que aposta no seu trabalho visual para impressionar o espectador, ao invés de manter-se quase completamente focada na manutenção da atmosfera de expectativa. Além das ocasionais figuras grotescas que com certeza agradarão espectadores mais empolgados, também é interessante notar certos detalhes como os olhos brilhantes de tais criaturas, que se destacam no escuro e acabam sendo mais adequados para a experiência televisiva. Só por elementos como esses, diversos espectadores que toparem com a série devem ficar plenamente entretidos. 

 (de quebra, ainda é possível assistir a série no “modo difícil”, para aqueles mais corajosos que se dispuserem a ir passando quadro-por-quadro, durante as cenas em que existem breves imagens assustadoras inseridas repentinamente. Simples, interativo e divertido).

Marianne, no entanto, traz uma primeira temporada relativamente dividida em fases distintas, primeiro acompanhando a dupla Emma e Camille (Lucie Boujenah), sua inocente e assustada assistente, e em seguida focando na dinâmica de grupo entre a autora assombrada e seu grupo de amigos de infância, que acabam se organizando para enfrentar a temida bruxa. Os episódios seguem uma estrutura narrativa que não só poderia se adequar às páginas de um livro, como também aproveitam elementos da outra mídia para estilização (além de citações no começo de cada episódio, passagens de tempo e recapitulações são acompanhadas por um virar de páginas). 

Logo no começo, já é possível engajar facilmente com a série por conta da personalidade destoante da protagonista, e suas interações com Camille. Mas embora o bom ritmo da temporada seja digno de nota, sinto que o engajamento sofra alguns revezes durante a segunda parte desta história, uma vez que o tempo gasto com os conflitos pessoais do grupo de amigos não me prendeu tanto a atenção, e desvios, como o episódio dedicado a eventos do passado, soem um tanto como artifícios utilizados apenas para preencher requisitos da temporada. 

A narrativa de Marianne nem sempre consegue construir seus argumentos da forma mais impactante, e seus tópicos às vezes acabam se atropelando ou entrando e saindo de evidência com menos discernimento do que seria o ideal para uma melhor compreensão deste cenário. Creio que o contraste entre as personalidades de Emma e Camille era mais produtivo para a construção da protagonista do que se vê nos episódios da segunda metade, assim como suas atitudes mais impulsivas também eram mais excitantes de acompanhar. 

Por outro lado, a série trabalha um equilíbrio tonal ao longo da temporada que a torna bem mais aproveitável como maratona. A trilha sonora, cheia dos típicos complementos para os sustos esporádicos, nem sempre se mantém tão tenebrosa, assim como as transições estilizadas tornam a série mais confortável, com certos momentos de alívio para a tensão. Com uma trama que se desenvolve rapidamente e alguns episódios mais curtos do que o normal, acompanhar Marianne como um grande filme chega a ser quase recomendável. 

Mas eis que a temporada se encerra com conclusões que não soam tão bem premeditadas quanto poderiam, tanto que o último episódio poderia ser encarado como uma terceira fase distinta das duas anteriores, com suas dinâmicas próprias. Com as resoluções do grupo de amigos já deixadas para trás, a série decide proporcionar um último grande embate aterrorizante para o espectador, além de preparar o terreno para uma possível segunda temporada, o que acaba tornando esta trama um tanto menos interessante do que parecia ser no começo. 

Marianne é uma série de terror que deve conseguir agradar um público abrangente com suas execuções visuais empolgantes e sua atmosfera bem trabalhada, eficientemente administrada por um roteiro que cativa o espectador com seu tom e emoção, mas que peca na orquestração de seu universo e de sua narrativa conforme aumenta sua escala, e precisa solucionar seus conflitos. Mas enquanto a produção francesa pode não ser tão edificante quanto “A Maldição da Residência HIll” (a comparação básica da vez, dentro da Netflix) e suas reflexões sobre o conceito de “assombração”, ao menos, temos uma série que é consistentemente assustadora e que dificilmente deixará qualquer espectador entediado com suas bruxarias.   

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